quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Ética a Nicômaco

ARISTÓTELES

ÉTICA A NICÔMACOS





Capítulo 1 [O bem como fim]

1094a - O bem [agathon] é o fim [telon] de todas as coisas. Os fins distantes das ações são os mais excelentes. Para muitas artes [technon] e ciências [epistemon], muitos fins. Os fins fundamentais devem ser os procurados e não os secundários.

Capítulo 2 - O sumo bem é desejado por si mesmo e tudo segue em direção a esse fim. O conhecimento desse bem é a arte mestra, como a política [politike].

1094b [Indivíduo e Estado] - A política abrange as outras ciências em função do bem humano. O bem do Estado [polesi] é maior, mais complexo, belo e divino que o do indivíduo. A ética busca o bem da ciência política.

Capítulo 3 - As ações belas e justas existem por convenção e não por natureza. Um bem pode ser prejudicial. A conclusão da investigação ética deve ser geral e aproximada, não admitindo precisão por natureza.

1095a [Princípio racional] - Quem for conhecedor de um assunto específico é bom juiz nesse assunto, quem tiver formação geral é bom juiz em geral. É em torno da experiência [bion praxeon] que giram as discussões éticas. O fim da política é o conhecimento da prática [praxis] e não especulativo [gnosis]. A investigação ética ajuda a quem quer agir por um princípio racional [logon] e não por paixões.

Capítulo 4 [Felicidade, fim da política] - Todos dizem ser a felicidade [eudaimonian], o bem agir [eu prattein] e viver [eu zen], o fim da ciência política. Mas há divergências sobre o que seja a felicidade.

1095b - A investigação deve começar pelos fatos conhecidos [gnorimov] pertinentes aos homens. Para isso é necessária uma educação de bons hábitos [ethesin echthai kalos]. Quem não é educado deve obedecer.

Capítulo 5 [Três tipos de vida] - Há três tipos de vida: vida dos gozos [hedonen], da política [politikos] e a contemplativa [theoretikos]. A honra [timen] é a finalidade da vida política. Procura--se a honra pela virtude [arete]. Assim, a virtude pode ser tomada como a finalidade da política.

1096a [Virtude] - Essa virtude é incompleta e compatível com sofrimentos e infortúnio. A vida consagrada à riqueza não busca um bem em si, porém algo útil para outra coisa.

Capítulo 6 -O bem pode ser compreendido como uma substância [ousia], ou qualidade [poio] ou relação [pros ti]. O bem substancial é anterior à relação. Não há idéia de bem comum no modo absoluto e relativo. O bem pode ter tantos sentidos quanto o ser, por isso não é único e universal. Decorrem disso o fato de haver várias ciências do bem.

1096b [O bem universal] - O bem em si e os particulares não diferem enquanto bem. Os platônicos falam de um bem em si e outros em relação a este. Estudando o bem em si, percebe-se que não há elemento comum em uma só idéia [idean]. O bem único e universal é inatingível ao homem.

1097a - O conhecimento do bem único e universal ainda que acessível não seja útil nos casos particulares.

Capítulo 7 [Conceito de felicidade] - O bem das artes é aquele em cujo interesse giram todas suas ações. O bem é a finalidade das ações. O bem supremo [ariston teleion] é absoluto, isto é, desejável em si e não pelo interesse de outra coisa.

1097b - A felicidade é esse bem buscado por ele próprio. Ela é perfeita e auto-suficiente [autarkes], torna a vida desejável e sem carência, sendo o fim de todas as ações. A felicidade depende da função do homem.

1098a [A função do homem] - A vida ativa da alma [psyches energeia] é a função [ergon] do homem. Ela implica num princípio racional [logon]. Além disso, o homem bom deve realizar bem suas ações. A atividade da alma deve estar em consonância com a virtude compatível.

1098b - Os primeiros princípios [arche] são estabelecidos por indução [epagoge theorountai], percepção [aisthesei], hábito [ethismo] etc.

Capítulo 8 - Os bens são divididos entre os externos, os do corpo e os da alma. Os melhores bens são os da alma.

1099a [O prazer em si] - A atividade virtuosa deve necessariamente agir bem. Os atos virtuosos são aprazíveis em si e por natureza. A felicidade é a melhor, a mais nobre e aprazível [hediston] coisa do mundo.

1099b - A felicidade depende dos bens exteriores para realizar atos nobres.

Capítulo 9 - A felicidade é uma dádiva dos deuses.

1100a - É feliz aquele que, além de possuir uma virtude completa [teleias], a tem por toda vida.

Capítulo 10 [A duração da felicidade]

1100b - Se a felicidade é algo permanente, há um paradoxo quando se afirma que o homem só é feliz ao final de uma boa vida. As atividades virtuosas são as mais duráveis. Durante toda vida, o homem feliz está dedicado à ação ou contemplação da virtude, suportando os reveses da vida. A nobreza de um homem deixa-se ver nos grandes infortúnios.

1101a - O homem sábio [emphrona] e bom tira o maior proveito das circunstâncias. Homens felizes são aqueles que estão em condições de se tornarem tal.

Capítulo 11

1101b - Os infortúnios futuros e o acaso têm influências muito fracas para a felicidade dos homens, não sendo capaz de alterar seu estado.

Capítulo 12 [O primeiro princípio]

1102a - A felicidade pertence às coisas estimadas e perfeitas. Ela é o primeiro princípio e causa dos bens.

Capítulo 13 - A felicidade é uma atividade da alma segundo a virtude perfeita. O político estuda a virtude antes de tudo. A virtude humana é a que se busca. O político, portanto, deve estudar a alma.

1102b - O homem continente, temperante e bravo obedece à razão.

1103a - O elemento irracional da alma é persuadido pela razão, pela reprovação e conselhos. As virtudes são intelectuais [dianoetikas] ou morais [ethikas]. As intelectuais são sabedorias [sophia], compreensão [sinesin] e prudência [phronesin]. As morais são generosidades [eleutherioteta] e a temperança [sophrosynen]. Os hábitos dignos de louvor são chamados virtudes.

LIVRO II

Capítulo 1 [Hábito e natureza] - A virtude intelectual desenvolve-se a partir do ensino [didaskalias]. A virtude moral resulta do hábito [ethous] e não por natureza. As coisas naturais não podem adquirir um hábito contrário a sua natureza. As virtudes são adquiridas pelo exercício [energesantes proteron].

1103b - A boa legislação [nomothetai] torna bons os cidadãos por meio dos hábitos. Do contrário, toda virtude pode ser destruída por uma má constituição. As virtudes e os hábitos tornam os homens justos ou não.

Capítulo 2 - A investigação ética não visa o conhecimento da virtude, mas a natureza dos atos na prática.

1104a - Na Ética a Nicômaco, esse assunto é tratado em linhas gerais e não de forma precisa. Nos casos particulares, cada um deve considerar o que é mais apropriado. A virtude pode ser destruída pelo excesso [hyperboles] e pela falta [phtheireta].

Capítulo 3 [Prazer e dor]

1104b - Os sinais do caráter são o prazer e a dor [lypen] do ato. A excelência moral relaciona--se com prazeres e dores. Por causa do prazer, fazem-se ações más, por causa da dor abstém-se das ações nobres. A educação [paidéia] certa deve levar em conta o deleite e o sofrimento. Cada ação e paixão são acompanhadas de prazer e dor. O castigo é efetuado pelo contrário do efeito da ação a ser punida. O vício [kakia], como a virtude relaciona-se com o prazer e a dor, mas de modo contrário. Há três objetos de escolha e três de rejeição: o nobre [kaloy], o vantajoso [sympherontos], o agradável [hedeos]; e o vil [aischroy], o prejudicial [blaberoy] e o doloroso [lyperoi], respectivamente.

1105a - Prazer e dor acompanham os homens desde a infância. É mais difícil lutar contra o prazer do que contra a dor. A virtude e a arte orientam-se pelo mais difícil. Os atos de onde surgem as virtudes são os mesmos em que ela se atualiza.

Capítulo 4 [Três condições do agente] - Para praticar a virtude, o agente deve estar em determinada condição. Deve conhecer o que faz; escolher os atos e suas ações por si mesmos procede do caráter firme e imutável.

1105b - O conhecimento tem pouco peso para posse da virtude, enquanto a prática constante dos atos justos e temperantes são condições indispensáveis. As ações justas são aquelas praticadas pelos homens justos ou que agem como tal. A prática da virtude torna o homem virtuoso.

Capítulo 5 - A virtude pertence ou a paixões [pathe], ou às faculdades [dynameis] e disposições [exeis] de caráter. As paixões são os sentimentos acompanhados de prazer e dor. As faculdades permitem sentir as paixões. As disposições de caráter são o que pode ser considerado bom ou mal diante das paixões.

1106a [Virtude e disposição de caráter] - Os homens são louvados ou censurados por suas virtudes ou vícios. As virtudes não são paixões, nem faculdades, mas disposições de caráter, pois as virtudes envolvem escolha.

Capítulo 6 - A virtude do homem é a disposição de caráter que o torna bom e que o faz desempenhar bem sua função. O meio termo [meson] é aquilo que é eqüidistante aos extremos.

1106b [Virtude e o meio termo] - Em relação aos homens, o meio termo é relativo, mas não ao objeto. A virtude é o atributo de visar o meio termo. A virtude diz respeito às paixões e ações, sendo o excesso e a carência [elleipseos] erros, enquanto o meio termo é a forma de acerto. Há muitos modos de errar, mas só um de acertar. O excesso e a falta são características do vício e a mediana [mesotes], da virtude.

1107a [Definição de virtude] - A virtude é uma disposição de caráter que escolhe a mediana determinada pela razão própria ao homem prático. É o meio termo entre dois vícios. A virtude é a mediana em sua essência; mas com relação ao bem supremo é um extremo. Não há virtude ou meio termo nas paixões extremadas, que são más por si. No excesso ou da falta não há meio termo, como não há excesso e falta na mediana.

Capítulo 7 [Casos particulares]

1107b - Entre prazeres e dores, o meio termo é temperança [sophrosyne] e o excesso, intemperança [akolasia].

1108a - Há três meios termos diferentes, mas com uma semelhança comum. Todos estão em intercâmbio entre atos e palavras. Um relaciona-se com a verdade [alethes] e os outros dois com o aprazível. Dos aprazíveis, um proporciona divertimento e outro se manifesta em todas as situações. A maioria das disposições não tem nomes, mas devemos inventá-los. Há meio termo nas paixões e em relação a elas.

1108b - Há na justiça [dikaiosynes] dois tipos de disposições, uma delas é o meio termo.

Capítulo 8 - Existem três espécies de disposição: duas são vícios - excesso e carência - e a terceira uma virtude, o meio termo. A disposição extrema é contrária ao meio termo e ao outro extremo. O meio termo é contrário aos extremos. Os estados medianos são excessivos em relação às deficiências e deficientes diante dos excessos. A maior contrariedade [antikeimenon] é a que esta entre os extremos e não entre extremos e meio termo.

1109a - O meio termo pode estar mais próximo de um extremo do que outro. Aquilo pelo qual o homem tende por natureza lhe parece mais contrário ao meio termo. Logo, é fácil ser intemperante do que contidos.

Capítulo 9 - A virtude moral é um meio termo entre dois vícios, o excesso e a deficiência. É a mediana nas paixões e nos atos. Por isso é difícil encontrar o meio termo. Quem visa o meio termo deve se afastar do que lhe é mais contrário.

1109b - Corre menos risco de errar quem se afasta do prazer. Nos casos particulares, a percepção decide até que ponto o homem merece censura. A maneira mais rápida de atingir o meio termo é inclinar-se para o excesso, ora para a deficiência.

LIVRO III

Capítulo 1 [Voluntário e involuntário]

1110a - A virtude relaciona-se com as paixões e ações voluntárias [praxeis ouses]. As paixões e ações involuntárias [akousion] ocorrem por compulsão ou ignorância. É forçada toda ação cujo princípio está fora de quem age. Os atos conscientes realizados por força das circunstâncias são mistos. Tais ações são voluntárias, pois os princípios estão em quem age e involuntários pois ninguém escolheria por elas.

1110b - As ações são forçadas quando a causa está na situação externa e o agente em nada contribui para esta. As involuntárias em si, que podem trazer vantagens a quem age, e cujo princípio está no agente, são voluntárias no momento em que são executadas em troca de vantagens. Tudo que se faz por ignorância [agnoian] é não-voluntário [hekousion], quando produz dor e arrependimento é involuntário. A ignorância dos casos particulares causa os atos involuntários.

1111a - A ignorância pode relacionar-se com qualquer circunstância dos atos e sua finalidade. Voluntária parece ser a ação cujo princípio se encontra no próprio agente que saiba as circunstâncias particulares do ato.

1111b - O involuntário é doloroso, o que está de acordo com o apetite é agradável. As paixões irracionais como a cólera ou as derivadas do apetite são ações do homem e, portanto não são involuntárias.

Capítulo 2 [Escolha] - A escolha [prairoumeta] parece voluntária, mas não se identifica assim. Ela não é comum à irracionalidade como a cólera e o apetite. A escolha é contrária ao apetite e não se relaciona com o agradável e o doloroso. A escolha não visa coisas impossíveis. Ela relaciona-se com os meios e não com os fins. Não se identifica com a opinião. A escolha caracteriza-se pela bondade ou maldade.

1112a - A escolha é correta quando se relaciona com o objeto conveniente e não por conveniência. A escolha envolve razão [logoy] e a reflexão [dianoias]. É aquilo que colocamos diante das outras coisas.

Capítulo 3 [Deliberação] - A deliberação [bouleuometa] ocorre sobre as coisas acessíveis e que podem ser realizadas.

1112b - Delibera-se sobre o que não é exato e o resultado é obscuro ou indeterminado. Delibera-se sobre os meios e não sobre os fins. Toda deliberação é uma investigação, mas não o contrário. As coisas possíveis são as que se podem realizar pelos esforços do agente e cujo princípio motor está nele. A deliberação gira em torno das coisas a serem feitas pelo agente, mas o fim das ações está em outra coisa.

1113a [Escolha e deliberação] - O objeto de escolha é o resultado da deliberação. A escolha é um desejo deliberado [boulesis] de coisas ao alcance.

Capítulo 4 [Escolha refletida] - A escolha refletida [proairesis] tem por objeto o fim. O bem é o objeto para o homem bom, que é quem percebe a verdade em cada classe de coisas, sua norma e medida.

1113b - Os enganos decorrem do prazer que parece ser bom sem sê-lo.

Capítulo 5 - O fim é aquilo que se deseja e o meio o que se delibera e escolhe voluntariamente. O exercício da virtude diz respeito aos meios. Depende de o agente ser virtuoso ou vicioso.

1114a - Punem-se todos os atos viciosos que dependem dos culpados. Os homens são responsáveis por serem injustos e intemperantes. Por meio das ações formam-se as ações de caráter. Além dos vícios da alma, os do corpo também podem ser voluntários.

1114b - Para o homem bom ou mal, o fim é fixo e todos agem relacionando cada coisa a ele. As virtudes são meios, disposições de caráter e tendem para prática dos atos virtuosos, voluntários de acordo com uma regra justa.

1115a - As disposições são voluntárias, pois está em poder do agente agir ou não de tal maneira.

Capítulo 6 [A coragem] - A coragem [andreias] é o meio termo entre o medo [phobous] e a confiança [tharre]. A bravura está relacionada com as coisas mais terríveis, como a morte em batalha.

1115b - É-se corajoso nas situações em que se pode mostrar o valor ou quando a morte é nobre.

Capítulo 7 [O homem bravo] - Bravo é o homem que enfrenta e teme as coisas que deve e pelo devido motivo. O homem bravo age conforme o caso e do modo que a regra manda. O bravo age sempre com fins nobres. O excesso da coragem é temerário. O excesso de medo é a covardia.

1116a - A covardia, a temeridade e a bravura relacionam-se com os mesmos objetos. A coragem é a mediana; a covardia e a temeridade os extremos.

Capítulo 8 [Cinco tipos de coragem] - Há cinco tipos de coragem. A do cidadão [politike] é mais próxima da verdadeira.

1116b - Deve-se ser bravo por nobreza e não por coação. A experiência e o conhecimento dos fatos particulares também são considerados coragem. A paixão também é confundida com a coragem.

1117a - A paixão corajosa parece a mais natural, tornando-se a verdadeira coragem quando acompanhada de escolha e motivo. Os otimistas assemelham-se aos bravos só porque sua confiança se baseia em vitórias sucessivas. As pessoas que ignoraram o perigo também parecem bravas, mas fogem logo que o percebem.

Capítulo 9

1117b - A coragem relaciona-se mais com as coisas que inspiram medo. A finalidade da coragem é agradável, apesar das circunstâncias. O exercício não é agradável em todas as virtudes, mas sempre no meio termo.

Capítulo 10 [Temperança] - Ao lado da coragem, a temperança é uma das virtudes das partes irracionais. É o meio termo em relação aos prazeres.

1118a - A temperança relaciona-se com os prazeres corporais do tato e do paladar.

1118b - O tato é o sentido com que se deleita a intemperança.

Capítulo 11 [O homem temperante] - Poucos são os apetites naturais que se enganam. Seus enganos são sempre para o excesso. Os prazeres individuais são muitos os que erram. O excesso em relação aos prazeres é intemperança. O homem intemperante sofre mais quando não obtém as coisas que gosta. Já o temperante não sofre com a ausência do que é agradável.

1119a - O temperante ocupa a posição mediana em relação aos prazeres.

Capítulo 12 - A intemperança parece mais voluntária que a covardia, graças ao prazer. Seus atos particulares são voluntários.

1119b - Num ser irracional o desejo de prazer é insaciável. os apetites devem ser poucos, moderados e racionais. Os apetites devem subordinar-se à razão, pois o homem temperante visa o nobre.

LIVRO IV

Capítulo 1 [Generosidade] - A generosidade [eleutheriotetos] é o meio termo em relação à riqueza. O homem generoso é louvado por dar e receber riquezas, aquelas coisas que se mede por dinheiro. Os extremos são a prodigalidade, o excesso, e a avareza, a deficiência.

1120a - O pródigo arruína a si mesmo ao gastar seus bens. O generoso é quem melhor utiliza a riqueza. Ele dá tendo em vista o que é nobre e como deve. O ato virtuoso é isento de dor.

1120b - A generosidade é usada sobre as posses de um homem, na disposição de caráter de quem dá. O generoso não estima a riqueza em si, mas como meio. O generoso é quem gasta de acordo com suas posses.

1121a - A prodigalidade excede no dar e não receber, já a avareza é deficiente no dar e excede no receber.

1121b - Os que têm o apetite de dar não se importam com a fonte de onde provém o que dão. Por isso, não o fazem com nobreza. A avareza é deficiente em dar e no excesso de tomar. Uns são deficientes em dar outros no excesso de tomar.

1122a - Os amantes do ganho indébito incluem-se no vício da avareza. Os homens erram mais no sentido da avareza, contrária à generosidade do que da prodigalidade.

Capítulo 2 [Magnificência] - A magnificência [megaloprepeias] também é uma virtude relacionada com a riqueza. Estende-se às coisas que envolvem os gastos. É um gasto de grandes quantias. O magnificente é generoso, mas o generoso nem sempre é magnificente. A falta é a mesquinharia, o excesso vulgaridade.

1122b [A honra é o fim da virtude] - O homem magnificente gasta dinheiro em vista da honra [timon], finalidade de todas as virtudes. A despesa justa é virtuosa.

1123a [Obras públicas] - O magnificente não gasta consigo, mas com objetos públicos. O vulgar, além do que é justo, visa à ostentação e não à honra. O mesquinho fica aquém da medida em tudo.

Capítulo 3 [Magnanimidade]

1123b - Magnânimo [megalopsichos] é o homem que se considera, com razão, digno de grandes coisas. Quem se julga digno disso, sem merecer, é vaidoso [chaynos]. O que se considera menos merecedor é indevidamente humilde [mikropsichos]. O magnânimo está no meio termo da justeza de suas pretensões. A honra é o maior de todos os bens exteriores. Honra e desonra são objetos da magnanimidade. O magnânimo deve ser bom no mais alto grau.

1124a - A honra é o prêmio da virtude e é rendida aos bons. A magnanimidade é o ápice das virtudes. Para ser magnânimo, é preciso bom caráter e nobreza.

1124b - O magnânimo age sempre com justiça.

1125a - O caráter do magnânimo basta a si mesmo. O falso humilde rouba a si aquilo que merece. Os vaidosos ignoram a si mesmos, desejando serem honrados sem merecer. O humilde indébito está mais oposto à magnanimidade que o vaidoso. O magnânimo relaciona-se com a honra em grande escala.

Capítulo 4 [Ambição]

1125b - A ambição [philotimon] é o desejo por honra além do que o conveniente e por fontes indébitas. O sem ambição não quer ser honrado nem por motivos nobres. Não há palavras para o meio termo entre esses extremos. A desambição e a ambição parecem contrárias porque o meio termo não tem nome.

Capítulo 5 [Calma] - A calma [praotes] é o meio termo para a cólera. O excesso é a irascibilidade.

1126a - A deficiência é a pacatez. Os irascíveis encolerizam-se com pessoas e coisas indébitas. As birrentas conservam a cólera por mais tempo. Os mal humorados encolerizam-se com o que não devem e não se acalmam, enquanto não se vingam. Esses são os excessos opostos à calma.

1126b - Os excessos de cólera devem ser censurados.

Capítulo 6 - Os obsequiosos louvam tudo e não se opõem a nada. Os grosseiros opõem-se e censuram tudo.

1127a - O meio termo não recebeu nome, por isso os extremos parecem ser contrários.

Capítulo 7 [Veracidade] - A jactância é o vício de pretender a glória, sem merecer ou mais do que possui. O falso modesto nega e amesquinha tudo o que possui. O meio termo não exagera, nem subestima. O homem veraz [aletheutikos] conserva-se no meio termo.

1127b - O veraz é também eqüitativo. O jactancioso é o contrário do homem veraz, pois é o pior extremo.

Capítulo 8

1128a - Os jocosos levam a espiritualidade ao extremo e os rústicos não sabem e não gostam de gracejos. Os que gracejam com bom gosto são espirituosos. O homem de tato e bem educado difere do vulgar em seus gracejos. O homem fino e educado [chaieis] dita a sua lei.

1128b - Espiritualidade, veracidade e moderação dizem respeito à vida social e têm relação com atos e palavras.

Capítulo 9 [Vergonha] - O sentimento de vergonha [aidous] fica bem apenas na juventude. Não é característica do homem bom [epieikous], pois acompanha as más ações. Caso o homem bom cometa uma ação má, sentirá vergonha. A continência também não é uma virtude, mas uma disposição mista.

LIVRO V

Capítulo 1 [Justiça]

1129a - Justiça é a disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é justo, desejando e agindo. Quando se conhece a boa condição, a má também se torna conhecida. A boa condição é dada pelas coisas em boas condições. O justo é respeitador da lei e o probo, o injusto é sem lei e ímprobo.

1129b [Justiça e felicidade] - Todos os atos legítimos são justos. São justos os atos que produzam e preservem a felicidade e seus elementos para a política. A justiça é considerada a maior das virtudes. É a virtude completa, pois ela é exercida sobre quem a possui e ao próximo.

1130a - A justiça é a virtude inteira e não uma parte dela. A injustiça [adikia] é seu contrário.

Capítulo 2 - Os atos injustos são atribuídos a alguma espécie de maldade.

1130b [Justiça em particular] - Existe mais de uma espécie de justiça. A investigação ética deve buscar aquela que se distingue da virtude no pleno sentido da palavra. Tudo que é probo é legítimo, mas nem tudo que é legítimo é probo. Em relação à justiça parcial [meros dikaiosynes], um tipo manifesta-se nas coisas que são divididas [dianomais] entre quem tem parte na constituição.

1131a - Outra tem um papel corretivo [diorthotikov] nos negócios humanos, voluntários e os involuntários.

Capítulo 3 [Justiça distributiva] - O justo é igual [ison]. O injusto iníquo [anison]. O justo é o meio termo por ser igual o ponto intermediário. O justo deve ser intermediário, igual e relativo para algumas pessoas. A igualdade observa-se entre as pessoas e entre as coisas. Não sendo iguais, não há recibo de coisas iguais. O justo é um termo proporcional. A proporção [analogon] é uma igualdade entre razões [logon].

1131b - O justo é a intermediária na distribuição [dianemetikon] e o injusto aquilo que viola a proporção. A proporção geométrica não é contínua. Não há um termo único para a pessoa e a coisa. O homem que age injustamente tem em excesso, enquanto o que é injustiçado recebe pouco do que é bom. No caso do mal ocorre o inverso.

Capítulo 4 [Justiça corretiva]

1132a - A justiça nas transações entre os homens é uma espécie de igualdade e a injustiça desigualdade. A lei deve considerar apenas o caráter do delito e tratar as partes como iguais. Se uma comete, a outra sofre a injustiça, uma é autora, a outra a vítima. A justiça corretiva [diortheotikon] será o intermediário entre a perda e o dano. O justo é um meio termo, pois é o juiz que restabelece a igualdade. O igual é intermediário entre a linha maior e a menor pela proporção aritmética.

1132b - O justo é intermediário entre um ganho e uma perda involuntários.

Capítulo 5 [Reciprocidade] - A reciprocidade [antipeponthos] não se enquadra na justiça distributiva, nem na corretiva. Ela deve ser feita de acordo com a proporção e não por retribuição igual.

1133a [Dinheiro] - A retribuição proporcional é garantida pela conjugação cruzada. Nesse sentido, introduziu-se o dinheiro [nomisma] nas negociações. Ele é o termo que mede todas as coisas, o excesso e a falta. O dinheiro tornou-se representante da procura pela unidade, mas por convenção [sintheken].

1133b [Acordo monetário] - Caso não fosse possível efetuar a reciprocidade entre os diversos produtos, não haveria associação entre as partes. O preço de cada bem garante a troca e a associação entre os homens. Deve haver um acordo [symmetra] que estabeleça a unidade do dinheiro, para que todas as coisas sejam comensuráveis. A justiça é um meio termo que se relaciona com a quantia ou quantidade intermediária, já a injustiça relaciona-se com os extremos.

1134a - Na ação injusta, ter demasiado pouco é ser vítima de injustiça e ter demais é agir injustamente.

Capítulo 6 [Justiça política] - A justiça política [politikon] é encontrada entre os homens que vivem em comum, em vista à liberdade [eleutheron] e igualdade entre eles. Suas relações são regidas por lei [nomos]. Não se permite que o homem governe, mas a razão, porque o homem governa pelo seu próprio interesse.

1134b - Não pode haver justiça incondicional quanto aos pertences. A justiça relaciona-se com a lei e entre pessoas sujeitas a lei. A justiça doméstica [oikonomikon] trata das relações familiares [pais e filhos] e escravistas [senhor e escravo].

Capítulo 7 [Natureza e lei] - A justiça política natural [physikon] tem a mesma força em qualquer parte, independente da razão humana; a legal [nomikon] é aquela que passa a viger depois de ser estabelecida a lei. Ambas as justiças são mutáveis.

1135a - As coisas justas relacionam-se como o universal [katholoy] para com o particular [kath ekasta].

Capítulo 8 [Atos de justiça] - Um homem é justo ou injusto sempre que age voluntariamente nesse sentido. É voluntário tudo que é feito com conhecimento de causa, sem ignorar a pessoa atingida, o instrumento usado e o fim alcançado. Também não pode ser acidental, nem forçado.

1135b - Os atos voluntários de escolha são praticados após deliberação. Os enganos são atos infligidos por ignorância da pessoa, do ato, instrumento ou fim. O infortúnio ocorre quando o dano é maior que o esperado. A injustiça é cometida quando se age sem deliberação prévia. Quando o homem age erroneamente por escolha é injusto e vicioso.

1136a - Um homem é justo quando age justamente por escolha, isto é, se sua ação é somente voluntária.

Capítulo 9 [A essência da justiça] - É contra vontade [ekeinos] que alguns são justamente tratados.

1136b - Também é possível tratar-se injustamente. Ninguém deseja ser injustamente tratado.

1137a - Saber como deve-se agir e como efetuar distribuições justas é mais difícil do que saber o que faz bem à saúde. Agir ou não com justiça resulta de uma disposição de caráter. A justiça é algo essencial ao homem.

Capítulo 10 [Eqüidade] - A eqüidade [epieikeias] e o eqüitativo não são idênticos à justiça e ao justo.

1137b - O eqüitativo é superior ao justo. É uma correção da justiça legal. Quando a lei universal falha no particular é justa a correção da omissão. O eqüitativo é superior à justiça legal e ao seu erro em caráter absoluto.

Capítulo 11 [Injustiça contra si mesmo]

1138a - O que a lei não permite expressamente, ela proíbe. O suicida age injustamente para com o Estado [polin] e não contra si. O justo e o injusto sempre envolve mais de uma pessoa. Quem faz dano a si sofre e pratica as mesmas coisas ao mesmo tempo. Poderia também ser tratado injustamente por querer. Ninguém age injustamente sem cometer atos de injustiça.

1138b - Há uma analogia da justiça entre o tratamento do homem com suas partes, não do homem consigo.

LIVRO VI

Capítulo 1 - O meio termo é ditado pela reta razão [orthos legei]. Há um padrão que determina as medianas. Além desse conhecimento da mediana, deve-se definir o que seja a regra justa e o padrão determinado.

1139a [Razão científica e calculadora] - Duas partes concebem a razão. Uma contempla as coisas de causas variáveis, outra as causas variáveis. Científica [epistemoniko] é uma dessas partes e calculadora [bouleuestai] a outra.

Capítulo 2 [Ação] - Três coisas controlam a ação e a verdade: a sensação, [aisthesis], inteligência [nous] e tendência [orexis]. A sensação não principia nenhuma ação. A escolha é uma tendência deliberada. A tendência reta corresponde à escolha acertada. O raciocínio verdadeiro afirma aquilo que deve ser buscado pela tendência reta. Esses são intelecto [theoretikes dianoias] e verdade prática [aletheia praktike]. Para o intelecto contemplativo, o bom e o mau são o verdadeiro e o falso. Na parte prática, o bom estado é a concordância da verdade com a tendência. A causa eficiente da ação é a escolha e a desta é a tendência e o raciocínio. A ação existe pela combinação de intelecto e caráter. Em si, o intelecto não move nada.

1139b - O intelecto produtivo [poietikes], depende de um fim. A boa ação é um fim ao qual o desejo é orientado. A origem da ação é o homem. A escolha é um raciocínio tendencioso ou uma tendência racional.

Capítulo 3 [Disposições da alma] - Cinco são as disposições da alma para a verdade: arte [techne], conhecimento científico [episteme], prudência [phronesis], filosofia [sophia] e inteligência [nous]. O objeto da ciência existe necessariamente e é adquirido por indução. A ciência é passível de demonstração, o epistêmico conhece os pontos de partida e tem convicção.

Capítulo 4 [Arte]

1140a - A ação [praxis] é diferente da produção [poiesis]. A arte é uma capacidade de produzir com raciocínio reto. É produção e não ação. A carência de arte é uma disposição acompanhada de falso raciocínio.

Capítulo 5 [Prudência] - A prudência contribui para a vida boa em geral. Quem é capaz de deliberar tem prudência. Ela não é epistêmica, nem técnica.

1140b - Não é epistêmica pois sua ação não é necessária, nem é técnica pois a ação não é produção. A prudência é uma capacidade verdadeira e racional de agir sobre as coisas que são boas ou más para o homem. A temperança preserva a prudência, que é uma virtude e não uma técnica. Ela é formada por opiniões, pois trata do variável.

Capítulo 6 [Inteligência]

1141a - O conhecimento epistêmico decorre dos princípios primeiros que não são objetos de ciência, arte, prudência ou filosofia. Assim, resta só a inteligência como aquela disposição que os apreende.

Capítulo 7 [Filosofia] - A filosofia deve ser a forma de conhecimento mais perfeita. A filosofia deve ser a inteligência combinada com o conhecimento epistêmico.

1141b - A filosofia é o conhecimento das coisas mais elevadas por natureza. A prudência diz respeito à ação e, como a filosofia, ela depende de uma outra sabedoria controladora [architektonike].

Capítulo 8 [Política] - A política é a sabedoria que diz respeito à cidade e faz parte da mesma disposição da alma que a prudência. Quando exerce o papel de controladora, ela é legisladora [bouleutike]. Quando trata dos assuntos das cidades como particulares é chamada política.

1142a - Saber o que é bom para si é um conhecimento prático que não o político.

Capítulo 9 [Deliberação]

1142b - Quem delibera investiga e calcula. A deliberação é um raciocínio lento. A excelência no deliberar é a correção. Essa deliberação correta tende alcançar um bem. No sentido absoluto, é o êxito alcançado no fim absoluto. No sentido particular, o êxito dá-se no fim particular.

Capítulo 10 [Perspicácia]

1143a - A perspicácia [eusynesis] trata das coisas que são duvidosas e motivo de deliberação. Ela só julga. A penetração [synesis] deriva da perspicácia, da aplicação à compreensão da ciência, ou conhecimento.

Capítulo 11 [Discernimento] - O discernimento [eugnomonas] é a reta discriminação do honesto [epieikous]. O bom discernimento é a capacidade de julgar as coisas da prudência. As eqüidades são comuns a todos os homens bons entre si e os outros.

1143b - O discernimento, a inteligência e a perspicácia são naturais.

Capítulo 12 [Habilidade]

1144a - A filosofia e a prudência são as virtudes das duas partes da alma, mesmo que elas não produzissem nada. A filosofia produz a felicidade. Uma obra é perfeita quando está de acordo com a prudência e a virtude moral. Um homem é bom quando pratica seus atos por meio de escolha e no interesses de seus atos. A habilidade [deinoteta] é uma faculdade que tem o poder de fazer as coisas segundo um fim proposto. Não tem prudência quem não é bom.

Capítulo 13

1144b - A prudência está para a habilidade, como a virtude natural está para a virtude moral propriamente dita [chiria]. A virtude propriamente dita envolve prudência . Não é possível ser bom sem prudência.

1145a - A prudência proporciona todas as virtudes. Ela fornece os meios de produzi-las.

LIVRO VII

Capítulo 1 [Incontinência] - Deve-se evitar o vício, a incontinência [akrasia] e a bruteza [theriotes]. A virtude divina é a disposição contrária à bruteza. Como o homem divino, o bruto é raro.

1145b - O contrário da incontinência é a continência [egkrateia] e da moleza [malakia], a fortaleza [karteria].

Capítulo 2 [Paradoxos da incontinência] - O incontinente não pensa, antes de chegar a esse estado, que deva agir assim.

1146a - Nem toda continência é boa. Ela pode levar a sustentar opiniões falsas.

1146b - Ninguém possui todas as formas de incontinência, mas outros são incontinentes em absoluto.

Capítulo 3 [Incontinente e conhecimento] - O homem incontinente absoluto relaciona-se com os objetos da intemperança de sua própria escolha.

1147a - Os incontinentes encontram-se num estado semelhante à loucura [mainomenon]. A linguagem que usam é própria dos farsantes. O incontinente age sob a influência de uma razão e opinião que não é contrária em si, mas apenas acidentalmente à reta razão.

1147b - A incontinência não é provocada pela presença do conhecimento, apenas pelo conhecimento perceptivo.

Capítulo 4 [Incontinência e sentimentos]

1148a - Os incontinentes são censurados pelos seus vícios e não por sua pessoa. Os incontinentes e os intemperantes, assim como os continentes e os temperantes, relacionam-se de algum modo com os mesmos prazeres e dores.

1148b - A semelhança de incontinência com alguns sentimentos faz com que ela seja denominada de acordo com o respectivo objeto em cada caso.

Capítulo 5 - Os estados brutais causados pela natureza não são chamados incontinentes.

1149a - Os excessos, nesse sentido, ou são brutos ou mórbidos [nosematodeis]. Os brutos o são por natureza e os mórbidos por doença. Há uma incontinência brutal e outra mórbida, mas só a humana é chamada apenas por incontinência.

Capítulo 6 [Apetite, absoluta incontinência]

1149b - O incontinente por cólera é vencido pelo raciocínio, enquanto há aquele que é tomado pelo apetite [epitimia] e não pelo raciocínio. A incontinência dos apetites, em sentido absoluto, é um vício.

1150a - A bruteza é um mal menor que o vício.

Capítulo 7 [Continência, moleza e fortaleza] - As disposições que se relacionam com os prazeres são incontinência e continência. Moleza e fortaleza relacionam-se com as dores. Quem busca o excesso de coisas agradáveis ou necessárias é intemperante. O intemperante é pior que o incontinente. A continência é mais digna de escolha que a fortaleza.

1150b - A efeminação [thyphe] é uma espécie de moleza.

Capítulo 8 [Incontinente e intemperante] - O intemperante não se arrepende de suas escolhas, já o incontinente pode arrepender-se. O primeiro é incurável, o segundo, curável. O vício não tem consciência de si, mas a incontinência sim.

1151a - A incontinência é contrária à escolha, o vício não. O incontinente é superior ao intemperante, nem mau em absoluto.

Capítulo 9 [Diferença entre incontinente e intemperante]

1151b - Os teimosos não se deixam persuadir facilmente a mudar de idéia. Ele atém-se à paixão e ao apetite, por isso não cedem. O intermediário entre o teimoso e o incontinente é o continente.

1152a - O continente e o temperante não contrariam a regra justa. O continente possui apetites maus e sente prazer, sem deixar-se conduzir por eles.

Capítulo 10 [Hábito] - O incontinente é incapaz de agir. É mais fácil mudar um hábito do que alterar a natureza.

Capítulo 11 [O prazer]

1152b - O filósofo político estuda o prazer e a dor para arquitetar o fim que avalia as coisas boas ou más.

Capítulo 12 [Defesa do prazer] - Das opiniões contrárias ao prazer, não se segue que ele não seja um bem.

1153a - A contemplação é um prazer que não envolve dor ou apetite. Os prazeres são atividades e fim. É uma atividade do estado natural, desimpedida. O prazer não impede a prudência. Os prazeres corporais implicam em dor e apetite.

Capítulo 13 [Felicidade e prazer]

1153b - O prazer é necessariamente um bem. Nada impede que o sumo bem seja um prazer ou conhecimento, apesar de haver prazeres e conhecimentos maus. A felicidade é uma atividade desimpedida mais digna de escolha, por isso é um prazer. A felicidade é uma coisa perfeita. Todos buscam o prazer.

1154a - A vida do homem bom não é agradável se as duas atividades não forem agradáveis.

Capítulo 14 - O homem mau busca o excesso e não os prazeres necessários.

1154b [Prazer bom] - Os prazeres que não envolvem dor não admitem excesso. São agradáveis por natureza e não por acidente. As coisas naturalmente agradáveis estimulam a ação da natureza sã. A natureza que muda é viciosa, por não ser simples e boa.

LIVRO VIII

Capítulo 1 [Amizade]

1155a - A amizade [philias] é uma virtude ou implica nesta. É necessária à vida. Por natureza, louvam-se os amigos de seus semelhantes. A mais genuína forma de justiça é um tipo de amizade. Homens bons são amigos.

1155b - A ética investiga os problemas humanos que envolvem caráter [ethe] e sentimentos [pathe].

Capítulo 2 [Útil] - O útil [kresinon] é aquilo que produz algo de bom e agradável. Deseja-se o bem aos amigos no interesse deles próprios. Quando esse desejo não é recíproco, chama-se benevolência [eunoia]. Na amizade, há reciprocidade.

1156a - Para serem amigas, as pessoas devem conhecer-se uma a outra, desejando-se bem.

Capítulo 3 [Tipos de amizade] - Os que amam pela utilidade, amam para eles mesmos; os que amam pelo prazer, pelo que é agradável. Essas são amizades acidentais. O útil não é permanente, quando desaparece a utilidade, esse tipo de amizade também se dissolve.

1156b - A amizade perfeita é a dos homens que são bons e afins na virtude. O amor e a amizade são encontrados em sua melhor forma nos homens bons. O desejo da amizade pode surgir depressa, mas a amizade não.

Capítulo 4 - As pessoas boas são agradáveis umas às outras.

1157a [A amizade em si] - Só os homens bons podem ser amigos por si mesmo. A amizade entre os bons é invulnerável à calúnia. Existem vários tipos de amizade, mas só uma tem o sentido próprio.

1157b - Os maus são amigos em vista da utilidade ou prazer.

Capítulo 5 [Amizade: disposição de caráter] - A distância não rompe a amizade, mas sua atividade. O convívio é a característica da amizade. Ela é uma disposição de caráter, pois envolve escolhas. Amizade é igualdade.

Capítulo 6 [Amizade útil e agradável]

1158a - Não se pode ser amigo de muitas pessoas, a não ser pela utilidade ou prazer. O bom é útil e agradável.

1158b - As amizades por prazer e utilidade mudam rapidamente.

Capítulo 7 [Amizade desigual] - Nas amizades que envolvem desigualdade, o melhor deve receber mais amor e o que é útil do que dar. Quando a distribuição é proporcional ao mérito das partes, estabelece-se a igualdade.

1159a - Quando a distância é grande, cessa a possibilidade de amizade.

Capítulo 8 [Amizade entre contrários] - O lisonjeiro é um amigo em posição inferior. A amizade reside em amar do que ser amado. Só aqueles que amam na medida justa são amigos duradouros.

1159b - Igualdade e semelhança é amizade, sobretudo quando afinadas pela virtude. Os maus são amigos por pouco tempo. Só acidentalmente, o contrário busca o contrário, nesses casos, o intermediário é o objeto real do desejo.

Capítulo 9 - A amizade depende de comunhão de bens.

1160a [Amizade política] - A amizade e a justiça existem entre as mesmas pessoas e são coextensivas. Todas as comunidades [koinomiai] parecem fazer parte da comunidade política e as amizades correspondem às espécies particulares de comunidade.

Capítulo 10 [Formas de governo] - Há três tipos de constituição: a monarquia, a aristocracia e a timocracia. A melhor é a monarquia e a pior a timocracia.

1160b - O desvio da monarquia é a tirania. O monarca visa o bem dos súditos e o tirano o seu próprio bem. A aristocracia degenera em oligarquia pela maldade dos governantes que tomam para si a maior parte das coisas. A timocracia degenera em democracia. A timocracia tem o governo da maioria, incluindo os despossuídos. A democracia apresenta um pequeno desvio quanto a isso. A monarquia é a forma paternal de governo. A tirania é o governo senhorial. A associação entre marido e mulher é análoga à aristocracia e à oligarquia.

1161a - A associação entre irmãos é a timocracia. A democracia parece uma família acéfala, onde todos têm licença para agir como entendem.

Capítulo 11 [Amizade e governo] - Cada tipo de constituição comporta amizade na medida em que há justiça. Nas formas de desvio, a falta de justiça implica na ausência de amizade.

1161b - A pior forma de desvio é a tirania, onde há pouca ou nenhuma amizade.

Capítulo 12 [Amizade e associações] - Toda forma de amizade envolve associação. A educação e semelhança de idade contribuem para a amizade.

1162a - Um homem não parece ter os mesmos deveres com um amigo, um estranho, camarada ou condiscípulo.

Capítulo 13 [Amizades moral e legal]

1162b - Há amizade em pé de igualdade ou em virtude a superioridade. Amizade baseada na virtude quer o bem de um e do outro. A amizade na utilidade é cheia de queixas, pois cada um usa o outro em seu próprio benefício. Há uma espécie moral e outra legal de amizades. O legal baseia-se sobre termos definidos. O moral não se assenta sobre termos fixos.

1163a - A amizade pela utilidade tem a vantagem para o beneficiado como medida. Nas amizades por virtude, o fim do benfeitor é a medida.

Capítulo 14 - Nas amizades por superioridade, cada qual quer obter mais proveito.

1163b [Medida da amizade] - Nesses casos, o superior deve tirar mais em honra e o inferior em ganho. O homem que serve na medida de sua capacidade é um homem bom.

LIVRO IX

Capítulo 1 [A proporção da amizade]

1164a - A proporção iguala as partes e preserva a amizade entre os dessemelhantes. Na forma política da amizade, o dinheiro é a medida comum pela qual tudo se mede.

1164b - Cada classe dá valor ao que é seu e que oferece, mas a retribuição é feita nos termos de que recebe.

Capítulo 2 - Melhor retribuir benefícios do que favorecer amigos.

1165a [A cada um o que merece] - A cada classe deve-se procurar oferecer o que for apropriado e comparar direitos de cada classe, segundo a virtude ou necessidade.

Capítulo 3 [Rompimento]

1165b - Não se pode amar todas as coisas, mas só o que é bom. Deve-se considerar a amizade de outrora se o rompimento não se deu por um excesso de maldade.

Capítulo 4 [Amizade do homem bom]

1166a - O amigo deseja e faz o bem no interesse do amigo e deseja que ele exista por ele mesmo. A conveniência, partilhar os gostos, as alegrias e os pesares também são características das amizades. A existência é boa para o homem virtuoso. Este deseja as coisas na medida em que elas o mantêm como é. O homem bom o é em relação a si mesmo, assim a amizade é um de seus atributos.

1166b - O extremo da amizade é comparado ao amor que sentimos por nós mesmos. Os maus sofrem no prazer por terem a alma pejada pelo arrependimento. Só sendo bom, pode-se ser amigo de si e dos outros.

Capítulo 5 - A benevolência não se identifica com a amizade. Ela não envolve desejo ou intensidade.

1167a [Benevolência] - É um sentimento que vem de súbito e superficial. É o começo da amizade. A benevolência é uma amizade inativa.

Capítulo 6 [Unanimidade] - Na unanimidade [homonoia], os homens têm a mesma opinião sobre o que é de ser interesse, escolher as mesmas ações e realizam-nas em conjunto. Não há unanimidade quando cada um pensa na mesma coisa, mas quando pensam nas mesmas coisas nas mesmas mãos.

1167b - A unanimidade é amizade política. Ela versa sobre coisas que são de nosso interesse e têm influência na vida em comum.

Capítulo 7 - Os credores não tem sentimento amistoso para com seus devedores.

1168a [Benfeitores] - Os benfeitores, entretanto, amam ao beneficiado como obra sua . A lembrança da coisa nobre é duradoura e da útil dura pouco. O amor é uma atividade e ser amado, passividade.

Capítulo 8 [Amor próprio]

1168b - O homem é seu melhor amigo e por isso deve amar a si mesmo [philautos] acima de tudo, enquanto os ególatras são criticados. Quando o elemento irracional domina o ególatra é censurado.

1169a - Quando o homem age de acordo com a razão, seus atos são considerados mais legítimos. Esse é o verdadeiro amigo de si mesmo. O homem bom deve ser amigo de si mesmo, mas o mau ofende tanto a si mesmo como aos outros.

1169b - O homem bom reserva para si mesmo a maior parte do que é nobre. Nesse sentido, o homem deve ser amigo de si mesmo, porém não no sentido da maioria.

Capítulo 9 [Amizade do homem bom] - O homem bom [eudaimona] necessita de amigos pois ele precisa fazer bem aos outros. O homem é um ser político e sua natureza é viver em sociedade. É melhor passar os seus dias com amigos e homens bons do que com estranhos. A felicidade é uma atividade. A atividade do homem bom é virtuosa e aprazível em si. As ações dos amigos virtuosos são aprazíveis aos bons.

1170a - O homem bom deleita-se com as ações virtuosas e entristece-se com as más.

1170b - Se o ser é desejável em si mesmo é semelhante para o homem feliz e seu amigo. O amigo será uma das coisas desejáveis. Para ser feliz o homem necessita de amigos virtuosos.

Capítulo 10 - O excesso de amigos é supérfluo e um obstáculo à vida nobre.

1171a [O número de amigos] - Convém ter tantos amigos quantos forem suficientes para os fins do convívio. O ideal do amor só pode-se sentir por uma pessoa. Só podemos sentir uma grande amizade por poucas pessoas.

Capítulo 11 [Presença dos amigos] - Os amigos úteis buscam-se na adversidade. Na prosperidade, os homens bons.

1171b - Deve-se buscar os amigos na prosperidade por ser mais aprazível e não na adversidade. O auxílio deve ser prestado sem ser solicitado, enquanto os benefícios devem ser partilhados quando convidados.

Capítulo 12 - A amizade é uma parceria.

1172a [O convívio na amizade] - Por isso, o convívio é natural. A amizade dos maus é uma péssima coisa, pois piora cada um no convívio, enquanto a amizade de homens bons cresce com o companheirismo.

LIVRO X

Capítulo 1 [Prazer] - A discussão sobre o prazer está relacionada com a vida humana. Para ter uma vida feliz, os homens escolhem o que é agradável e evitam a dor.

1172b - O prazer é preferido a todas as coisas. Os argumentos verdadeiros harmonizam-se com os fatos.

Capítulo 2 [Opiniões sobre o prazer] - Para Eudoxo, o prazer é o bem para o qual todos os seres tendem. O prazer é o objeto de preferência mais genuíno, pois é em si mesmo um objeto de escolha. Para Platão, o prazer não é um bem, pois este não pode tornar-se mais desejável pela adição de outra coisa, como ocorre na adição da sabedoria à vida prazerosa.

1173a - Mesmo nas criaturas inferiores, deve haver algum bem natural que as oriente para o bem que lhes é próprio. A preferência pelo prazer e a aversão pelo mal são a natureza da oposição entre os dois.

Capítulo 3 [Definição de prazer] - O prazer pode diferir em grau. A mesma proporção não é encontrada em todas as coisas, nem sempre na mesma coisa.

1173b - Quanto à imperfeição dos movimentos, pode-se passar depressa ou devagar a um estado de prazer, embora não se possa sentir prazer rapidamente. O preenchimento não é prazer. A aprendizagem, as lembranças, o olfato, a audição e a visão proporcionam prazeres que não pressupõem a dor. O prazer do homem justo só pode ser sentido pelo justo e o do músico, pelo músico. O prazer não é um bem e difere em espécie.

1174a - Nem tudo que se escolhe por trazer prazer, como a posse da visão, memória, conhecimento. O prazer não é o bem, nem todo prazer é desejável, outros diferem em espécie, enquanto há aqueles que são buscados por si mesmo.

Capítulo 4 - O prazer é um todo completo.

1174b [Prazer e atividade] - O prazer é completo em todo momento. Logo, não há movimento [kinesis] ou geração [genesis] no prazer, pois é um todo. O órgão do sentido mais completo é o mais aprazível e o mais nobre o mais completo. O prazer completa a atividade como um fim alcançado.

1175a - O prazer acompanha a atividade. Quando está não é contínua, aquele também o é. Ao relaxar a atividade, o prazer é embotado. A vida é uma atividade em relação com as coisas e as faculdades preferidas. Sem atividade não há prazer e cada atividade é completada pelo respectivo prazer.

Capítulo 5 [O prazer do homem bom] - Os prazeres diferem em espécie e têm objetos diferentes. As atividades do pensamento são diferentes das dos sentidos.

1175b - O prazer de uma atividade interrompe a outra. Os prazeres estranhos destroem a atividade. O prazer de uma atividade digna é bom e vice-versa. Eles estão unidos às atividades e são difíceis de separar.

1176a [A medida de todas as coisas] - Os prazeres do pensamento são superiores aos dos sentidos. A virtude e o homem bom são a medida de todas as coisas. Os verdadeiros prazeres são aferidos por essa medida.

Capítulo 6 [Felicidade]

1176b - A felicidade não é uma disposição, mas uma atividade [energeian]. A felicidade deve ser incluída entre as atividades desejadas em si. As ações virtuosas, nobres e boas são desejáveis em si. Para o homem bom, a atividade que concorda com a virtude é a mais desejável. A recreação não é a felicidade por ser um fim tolo e pueril. O divertimento é um tipo de relaxamento que não é um fim, pois visa realizar melhor uma outra atividade, o trabalho.

1177a - A atividade séria é melhor e superior, participando mais da felicidade. A felicidade está, portanto, nas atividades virtuosas.

Capítulo 7 [Vida contemplativa] - A felicidade é uma atividade que corresponde a mais alta virtude. Sua atividade é a vida contemplativa, pois razão é a melhor coisa nos homens e a mais contínua. A contemplação da verdade é a mais contínua de todas as atividades. A atividade da filosofia é a mais aprazível das atividades virtuosas. A atividade contemplativa é auto-suficiente. Mesmo só, o filósofo pode contemplar a verdade.

1177b - A atividade contemplativa é a única amada por si. Dela nada decorre além da contemplação. A atividade das virtudes práticas não encerra lazeres, ao contrário da felicidade. Elas visam um fim diferente e não são desejáveis por si mesmas. A atividade contemplativa só é acessível ao homem na medida em que ele tem algo de divino. A razão é divina em comparação ao homem e a vida racional é divina diante à humana.

1178a - Deve-se buscar essa forma de vida por superar tudo em poder e valor. Por menor que seja essa é a melhor parte do homem. Para o homem a vida conforme a razão é a melhor e mais aprazível. A vida intelectual [noun bios]. Essa é a vida mais feliz.

Capítulo 8 [O mais feliz dos homens] - As virtudes morais ligadas à prudência são humanas e suas vidas e felicidade também. Mas a excelência da razão é uma coisa a parte.

1178b - A vontade e o ato estão na virtude perfeita. Os atos do homem contemplativo não exigem coisa alguma para sua execução. As ações são triviais e indignas dos deuses. A atividade divina deve ser a contemplativa e desta deve participar a melhor atividade humana. Os outros animais não participam da contemplação. A felicidade de ser alguma forma de contemplação. A natureza humana não basta a si mesma para os fins de contemplação.

1179a - A auto-suficiência [autarkes], no entanto, não implica em excesso. A vida do homem que age em virtude é feliz. O filósofo [sophos] é o de todos os homens o mais caro aos deuses. Ele é o mais feliz dos homens.

Capítulo 9

1179b - O conhecimento da virtude não é suficiente. Deve-se buscar alcançá-la e usufruí-la. O homem comum só obedece por força do medo. É preciso cultivar a alma do estudioso por meio de hábitos, tornando-a capaz de atos nobres. Também é condição prévia indispensável à existência de um caráter que tenha afinidade com a virtude. Os jovens e a maioria das pessoas não se seduzem pela vida temperante e esforçada, por isso, as leis devem ser fixadas.

1180a - Os castigos devem ser contrários aos prazeres dos homens que amam. O homem que quer ser bom deve ser bem adestrado e acostumado. A lei tem o poder coercitivo, pois é baseado na inteligência e prudência.

1180b - O controle privado é mais preciso do que o público, pois cada um tem mais probabilidade de receber o que convém. Pelas leis é que se torna bons os homens, portanto, o educador deve ser capaz de legislar.

1181a - Os políticos fazem política por habilidade ou experiência [empeirias] e não por raciocínio. A experiência é uma contribuição importante. Quem quer conhecer a política deve ter experiência.

1181b - As leis são as obras da política. É preciso estudar a constituição política em geral, a fim de completar a investigação sobre a filosofia humana [anthropika philosophia].